segunda-feira, 9 de junho de 2014

Passeio no Douro II

( Continuação)

2º dia

Régua

No segundo dia, ao acordar, da janela do meu quarto o rio tinha a cor cinzento chumbo.





    Mas logo o sol se descobriu e o rio de cinzento passou a azul.







    Da Régua abalamos para o Vesúvio, de comboio, com o sol  sempre forte.



   E o rio que na Régua de cinzento passou a  azul, agora vai  passar a verde.

   As imagens são recolhidas com o comboio em andamento e através do vidro da janela. 
















Chegados ao Vesúvio,  almoço na Casa da Boa Comida que fez jus do nome, para onde nos transportamos de auto-carro.

 Ementa:

 Óptimas pataniscas de bacalhau com azeitonas
 cozido à portuguesa feito em potes de ferro na lareira
 leite creme
 arroz doce
 pão maravilhoso
 vinho da região
 café


Duas belíssimas rosas das muitas roseiras que encontramos nas bermas do caminho de acesso ao restaurante.




Depois de almoço,  e de auto-carro,  encaminhamo-nos para a casa que foi propriedade de Dona Antónia Ferreira,  a Ferreirinha e que Agustina usou como sendo a casa de Osório com quem Ema teve uma relação amorosa. A este propósito, lê-se o seguinte:

(...) O seu refúgio era o Vesúvio. Chegava lá depois de muitas horas de viagem, num comboio a vapor, com transbordo, cheio de gente muito selvagem, completamente desbocada, feliz na sua prosmicuidade.(...)



A casa do Vesúvio;  defronte, o monte que lhe deu o nome

(...)Muitas vezes Osório não aparecia. Ema ficava bloqueada pela chuva, passava no Vesúvio quatro ou cinco dias, aborrecendo-se de morte, folheando revistas velhas.(...)

(...) Ema jantou sozinha na sala enorme, com aparadores como capelas onde brilhavam os dragões rosa da louça da China. Era a casa dos Osório do Vesúvio, construída no estilo barroco, com escadas de pedra e um terraço sobre o rio. Uma casa lendária, que cheirava a vinho fino, a aguardente vínica, a vinagres de cheiro.(...)










Pormenores da casa do Vesúvio

  Lê-se no Vale Abraão:

(...) Quando chegava ao Vesúvio, não era para se reunir com Fernando Osório; mas para navegar a sós naquele rio escuro, sabendo que o barco podia voltar.se pelo risco que lhe impunha duma velocidade exagerada para o seu calado.(...)

(...)O mordomo Caires prevenia-a do mau estado do cais. As tábuas lodosas tinham apodrecido no último Inverno, a ponto de os cães não quererem pisá-las.
-Eles sabem que não estão seguras. Mas ainda não arranjei ninguém para as consertar.
Ema passou a conhecer melhor o pontão, a esquivar-se dos seus estalidos, a saber onde vergavam as madeiras; eram só uns segundos de perigo, depois encontrava-se, como num ventre macio, dentro do barco, cujas almofadas azuis a rodeavam. E Ema deixava-se levar no fio da água, vendo a esteira de prata que a seguia fora do peso dos elementos; como se voasse ao encontro de um sentido que fosse o sinal da incarnação feminina.  As altas falésias, de pedra granítica e tumular, levantavam-se nas margens. Não se podia chamar margens àquilo. Eram detalhes dum vulcão; eram, nas pedras, rasgões de garras que ali tivessem escorregado. Quem? O silêncio impenetrável subia até aos sarçais onde restos de oliveiras, que não morriam nunca,  pareciam ossadas desenterradas.(...)

(...) Fernando Osório fora um amante fútil que ela usara como o golpe de rins do mergulhador que muito tempo percorre os abismos em busca de uma riqueza afundada;  e que, de repente, compreende que está em vias de afogar-se, que os pulmões vão explodir se não puder voltar à superfície.(...)

(...) O Vesúvio transmitia-lhe uma lisa imagem de si própria: a mulher adúltera(...)




 (...)Depois de jantar, como era ainda dia, Ema desceu ao cais de embarque, disposta a dar uma volta na lancha(...)

(...) Ao saltar para a embarcação, sentiu,  debaixo dos pés, o ruído aziago das pranchas podres. Estavam a ceder e ameaçavam ceder sob o peso de alguém. Como Ema era leve, elas apenas gemeram e pareceram resistir.  Mas, subitamente, esboroaram-se como cogumelos negros dos que crescem nas árvores e anunciam a sua morte. Ema não teve tempo de agarrar a beira do barco, o lodo fez-lhe fugir das mãos o casco, que ficou a balançar suavemente, sem ruído. Ela afundou-se rapidamente(...)


                                                 A rampa que acede ao cais de embarque

De visita à quinta fomos ver uma adega, entre as nove, acompanhados de um engenheiro agrónomo  e, ficamos a saber que as vinhas do Douro exigem o dobro do investimento em relação às vinhas  do Alentejo; consequência inevitável da configuração do terreno.


 visita à quinta


 na adega





Ficamos a saber também que o vinho se continua a fazer pelos processos  primitivos com os mesmos rituais, mantendo a qualidade e a tradição;  e as adegas, assim como os lagares, se conservam integralmente os mesmos. Depois de reparados têm a mais a energia eléctrica, como referiu com alguma ironia o engenheiro que nos acompanhava.
Depois disto, despedimo-nos do Vesúvio e desta vez sem prova de vinhos, o que lamentamos.

Fica a recordação de um interessante passeio e a certeza de que  as atracções da região do Douro são infindáveis e, em qualquer altura do ano, o rio aposta sempre em nos surpreender!


24, maio 2014
Maria Cancela
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