segunda-feira, 14 de junho de 2010
Migalhas que ficaram VII
O Sr. José Frango
Sim, traga com fartura...
O seu nome era José da Silva Arcos, mas a família tinha a alcunha dos "Frangos". Por isso, na gíria popular, por ela é que assim eram todos designados.
O Sr. José Frango fora até ao Brasil donde trouxera algumas economias que lhe serviam de ajudóiro a uma vida sem desaprumos. Mas depois que regressou ao seu lar, administrava o amanho dumas pequenas e magras courelas pelos seus familiares.
A moradia estava situada na encosta da Lomba. Era uma modesta casa térrea e torre com as indispensáveis instalações agrícolas.
A Lomba fica no flanco noroeste do monte de Casais. A seus pés correm as águas dos Urdais que ali ao pé se vão juntar às do Este, depois de ter andado pelas Felgueiras e pelas Arroteias.
O vale que os dois fertilizam e regam, é úbere. Os viçosos prados sempre verdejantes com as forragens dos gados, os triguedos das searas, as frondosas ramarias dos choupos e salgueiros que marginam a corrente, e os vinhedos que circundam os campos, são um deleite aos olhos de quem observa.
Para o Sr. José Frango, a Lomba era uma ampla açoteia natural, donde podia admirar e gozar um maravilhoso panorama que dali se lhe patenteava.
Se volvia os olhos para o nascente, deparava com uma extensa planície para lá da Cancela do Cerco, por onde corriam as lebres ladinas e se acoitavam raposas matreiras. As copas dos pinheiros que a revestem e cobrem, semelham um tapete de veludo em tons verde-negros. E quando o Bóreas enfurecido começa a bufar, a sacudir e vergar as suas ramarias, assiste-se a um curioso e ciclópico espectáculo, semelhante aos galopes épicos de belicosos esquadrões em luta. Passada a fúria, regressa a calma; e então pode-se contemplar aquelas pontas erguidas para o céu em serena e pacífica quietude.
Mas se olhasse para ocidente, o panorama era completamente diferente. Emoldurado pelas Pedregulhas e o morro pinígero da Quinta de Baixo, o quadro era surpreendente de boculismo e beleza. Sobre um fundo azul com pinceladas de esmeralda e ocre, surge a silhueta esguia da igreja paroquial, de grimpa ponteaguda a recortar-se no espaço do infinito. Por vezes os raios luminosos do sol no ocaso, difundindo-se por entre os farrapos de alguma nuvem arredia, projectando-se para além, matizam o horizonte como de tela se tratasse, de zarcão e púrpura.
E se olhasse na direcção do quadrante de nordeste, a vista ultrapassava para além da ourela da freguesia, destacando-se a cumiada da Serra de Rates e o vale extenso.
E era aqui que o Sr. José Frango desfrutava e gozava os seus dias, não permitindo que se esquecesse o seu estatuto de "brasileiro" ao qual, sempre se associava a ideia de abastança.
.-.
A mulher acerca-se. Traz na mão uma almotolia grande, de canada, para o azeite. E anunciando que é preciso dele prover-se, interroga da porção que deseja que ela traga:
- Então, quanto será melhor trazer?
- Sim, - responde ele a fanfarrear aparências de grandeza - traga que chegue; traga com fartura para não andar sempre a comprar.
- Mas então, vá ... diga quanto hei-de trazer.
- Traga que chegue. Aí ... um quarteirão dele...
E lá vai ela, a mulher, toda empertigada, com aquela avantesma na mão para trazer dentro dela um quarteirão de azeite;" para não andar sempre a comprar".
Rates ( anos 60)Joaquim D. Cancela
Canada - 1,5 l
Quarteirão - 0,125 l
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