segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O Porto em fotografia

A magia de um fotógrafo

O mar em Montevideu

foto de Mariano Pires


Música

Helene Grimaud
uma pianista que gosto de ouvir




quarta-feira, 25 de setembro de 2013

LUTO PELO POETA MEDIADOR DA LUZ

  1. O luto voltou a abater-se sobre Maria Teresa Horta. Esta manhã acompanhou à sepultura, no Cemitério dos Prazeres, o poeta António Ramos Rosa. É um luto profundo, que nasce das raízes da poesia de MTH. Foi, de facto, António Ramos Rosa o poeta a quem a jovem Teresa confiou os seus primeiros poemas, com pedido de parecer. Fê-lo por correio, em fins de 1959, num sobrescrito registado e endereçado de Lisboa «ao poeta António Ramos Rosa – Faro». Três dias depois, um telefonema de Ramos Rosa louvava o talento da jovem poetisa e estimulava-a a publicar a poesia em livro, propondo-se assegurar a respectiva edição. Assim nasceu, em Maio de 1960, «Espelho Inicial». Mais tarde, em 1987, no seu livro de estudos sobre a poesia portuguesa contemporânea «Incisões Oblíquas», António Ramos Rosa salienta «a subversão do desejo» na poética de Maria Teresa Horta. Segundo o autor, para MTH «é a própria existência que emerge na sua palavra e nela se apreende e se repercute. Seja directa, seja metafórica, a sua linguagem tem a ardência vital do corpo e a sua violência sensual é, em toda a sua irracionalidade, libertadora e subversiva». A relação de amizade e admiração dos dois poetas manteve-se ao longo dos anos, tendo Teresa garantido o exclusivo, remunerado (o que não era, nem é, vulgar), da publicação de poemas de António Ramos Rosa no suplemento «Literatura & Arte» de «A Capital». E, em Outubro de 2002, a pedido do poeta, Maria Teresa Horta, lança, na Livraria Bulhosa, ao Campo Grande, o seu livro «A Rosa Intacta» (ver foto abaixo). Esta tarde, no regresso do adeus ao poeta, MTH escreveu o seguinte poema:

MEDIADOR DA LUZ

Para mim sempre foste
o poeta
mediador da luz

Transfigurando a realidade
em utopia, na sua triagem
de versos e palavras

Em busca da metamorfose
da claridade,
nas fundações da linguagem

Seduzindo a ilusão
pelo voo da asa
num abismo profundo

Aquele que toma o sonho
e o conduz,
mudando cada poema

em mundo


Maria Teresa Horta, 25 Setembro 2013
 Texto e foto retirados da cronologia de MTH

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Poesia


«OUTONO» - 3ª. E 4ª. PARTES
Terceira e última parte da elegia concluída por MTH no recente equinócio de Outono.

OUTONO

- 3 -

Duvido sempre do outono
sigo as suas pistas macilentas
esvaídas e translúcidas

seus incertos vestígios

Enquanto, uma por uma
as estações equívocas decepam
as flores mártires e fatídicas

as rosas tamisadas das lágrimas

E em seguida os lagos vão
surgindo, de súbito nimbados
por um escasso halo azul-violeta

beladona brotando das ruínas

Venenos a provocarem o transe
a que a realidade obriga e leva
até ao coração das penumbras ínvias

crendo ser o véu translúcido

No esvaimento da alba
ou no encobrir o rosto
esquálido das noviças

Escassas claridades lívidas

Nas submersas, adversas
e secretas cavernas mais íntimas
onde habitam as deidades invisíveis

Oh os amores malditos!

O meu amante busca-me
e julga perder-me, na brancura
da neve intocada e austera


- 4 -

Questiono sempre o outono
seguindo-lhe as águas
propiciatórias às suas interioridades

de luz refractária

Errantes, as águias pairam
no cimo, planando cismadas
voando a quebradura e o equívoco

desapiedadas

Enquanto o meu amante
descrente da paixão
me vai deixando para trás

E exausto me abandona
desprendido e inclemente

Maria Teresa Horta, 22 Setembro 2013

NOTA: A elegia «Outono», embora estruturada em quatro partes e objecto de três posts nesta Página Oficial, é um poema único.
 
                                                             foto de MTH-Página Oficial
 
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Na morte de António Ramos Rosa


Lux Aeterna

Homenagem



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segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Na morte de António Ramos Rosa

O TEMPO CONCRETO

O tempo duro
com estas unhas de pedra
este hálito podre
de órgãos esfomeados
estas quatro paredes de cinza e álcool
este rio negro correndo nas noites como um
[esgoto
O tempo magro
em que minhas mãos divididas
nitidamente separadas e caídas
ao longo dum corpo de cansaço
pedem o precipício a hecatombe clara
o acontecimento decisivo

O tempo fecundo
dos sonhos embrulhados repetidos como um hálito
[de febres
repassadas no travesseiro igual das noites e dos
[dias
das ruas agrestes e pequenas da mágoa
familiar e precisa como uma esmola certa

O tempo escuro
da peste consentida do vício proclamado
da sede amarfanhada pelas mãos dos amigos
da fome concreta dum sonho proibido
e do sabor amargo dum remorso invisível

O tempo ausente
dos olhos dum desejo de claras cidades
em que acenamos perdidos às soluções erguidas
com vozes bem distintas de cadáveres opressores
com gritos sufocados de problemas supostos

O tempo presente
das circunstâncias ferozes que erguem muros
[reais
dos fantasmas de carne que nos apertam as mãos
das anedotas contadas num outro mundo de cafés
e das vidas dos outros sempre fracassadas

O tempo dos sonhos
sem coragem para poder vivê-los
com muralhas de mortos que não querem morrer
com razões de mais para poder viver
com uma força tão grande que temos de abafar
no fragor dos versos disfarçados

O tempo implacável
em que jurámos de pé viver até ao fim
maiores dos que nós ser todo o grito nu
pureza conquistada no seio da vida impura
um raio de sol de sangue na face devastada

O tempo das palavras
numa circulação sombria como um poço
de ecos incontrolados
de timbres inesperados
como moedas de sangue cunhadas numa noite
demasiado curta e com luar demais

O tempo impessoal
em que fingimos ter um destino qualquer
para que nos conheçam os amigos forçados
para que nós próprios nos sintamos humanos
e estes fardo de trevas esta dor sem limites
a possamos levar numa mala portátil

O tempo do silêncio
em que o riso postiço dos fregueses da vida
finge ignorá-lo enquanto soluçamos
de raiva de razão reprimida revolta
e os senhores do bom senso passeiam divertidos

O tempo da razão
(e não da fantasia)
em que os versos são soldados comprimidos
que guardam as armas dentro do coração
que rasgam os seus pulsos para fazer do sangue
a tinta de escrever duma nova canção

António Ramos Rosa, in O GRITO CLARO, Colecção "A Palavra", n.º 1, Faro - 1958


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Poesia

«OUTONO» - 2ª. PARTE
Segunda das quatro partes da elegia concluída por MTH anteontem, dia do equinócio de Outono.

OUTONO

- 2 -

Suspeito sempre do outono
caminho pelas suas
sombras furtivas e ruivas

algemada à turvidade

Seguindo o rasto das horas
fugidias, das luzes esquivas
do termo, nos finais de tarde

desorganizando os ventos

E as solidões vazias, por entre
os lobos e as raposas, à espreita
pelas frestas das noites de alquimia

Crepúsculo - acrescento

Não sabendo impedir
que se esgarcem, dia após dia
as inúmeras claridades findas

Equinócio no dealbar do verão

Luminescências esbatidas
à medida que as lâminas
do inverno se aproximam

no decorrer dos meses

Onde se tropeça nas lajes, nos líquenes
nas pedras, nas humidades da terra
nas raízes, nas incertezas do gelo

esvaído e desabrido

O meu amante busca-me
no pranto, pelo meio
dos cardos e dos abetos

Maria Teresa Horta, 22 Setembro 2013




foto da Cronologia de MTH-Página Oficial

domingo, 22 de setembro de 2013

Poesia

«OUTONO»
Primeira das quatro partes do poema que Maria Teresa Horta concluiu hoje, 22 de Setembro de 2013, dia do equinócio de Outono.

OUTONO

- I -

Desconfio sempre do outono
ando pelos seus atalhos
observando as rotas que nos levam

até ao frio

Mostrando a queda mosqueada
da folhagem das árvores
da grossura do sol a transformar-se em fio

de gelo quebradiço

Perco-me pelas suas sigilosas
grutas de granizo
que me impedem de hibernar

de emigrar

Partindo de mim mesma
para lugares seculares
de menor desabrigo

até me encontrar

No inverso, no acesso
a um desassossego antigo
onde nunca consigo

defender-me deste frio maior

A gelar a névoa que me habita
a memória, prendendo-me
à correnteza gélida dos rios

Catarse - digo

Enquanto o meu amante
se transfigura, melancólico
e solitário na sua cama álgida

(...)

foto da cronologia de MTH- Página Oficial